quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Crack pode causar preguiça e enfado

O noticiário sobre as ações da Prefeitura de São Paulo e do Governo do Estado para enfrentar o tráfico e o consumo de crack, no centro da capital paulista, contribui, no mínimo, no mínimo, para colocar o assunto em debate e reflexão de todo o País. Quem dedica espaço destacado ao tema, claro, são a Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, entre os jornais.
Na Folha, dia 11, o colunista Igor Gielow, no artigo `Basta “curtir”´, escreve que  “por previsível, quase causa enfado a disputa política sobre a ação na cracolândia paulistana, de resto um imperativo da cidade contaminado desde a saída pelos interesses do combalido governo (Gilberto) Kassab (PSD). Quem sabia do quê, planos mirabolantes. Ah, as eleições”.
Outro parágrafo: “Agora é a vez do governo federal, que busca estabelecer um roteiro adequado às pretensões eleitorais do pré-candidato a prefeito Fernando Haddad (PT): o de que São Paulo meteu os pés pelas mãos e não participou de um esforço coordenado (pelo Planalto, claro) contra o crack”.
“PIROTECNIA”
Estadão, dia 11, informa que o Ministério Público Estadual abriu inquérito para investigar a operação do governo paulista e da Prefeitura na cracolândia. Para os promotores, a ação, “precipitada e aparentemente desastrosa”, é feita à base de cavalos, balas de borracha, dor e sofrimento”. “É pirotecnia”, reagiu o secretário de Estado Antonio Ferreira Pinto (Segurança Pública).
Procurador de Justiça licenciado, Ferreira Pinto criticou o órgão do qual faz parte. “Me sinto à vontade para dizer que essa ação dos promotores foi apenas para se promover”, disse na Folha do mesmo dia. Conforme o secretário do governo Geraldo Alckmin (PSDB), a cidade de São Paulo conta com 1.200 vagas para tratamento de dependentes químicos. Número que ele considera suficiente para atender os usuários da cracolândia.
O plano federal previa polícia na cracolândia só em abril, reporta o Estadão (dia 10). “O cronograma federal para ações na cracolândia, obtido pelo Estado, previa que a polícia só começaria a atuar em abril. A proposta, para ser discutida com os governos estadual e municipal de São Paulo, era fortalecer os serviços de retaguarda em saúde e proteção social a partir de fevereiro. Depois, em abril, seriam criadas bases móveis da PM. Além de São Paulo, estão previstas ações no Rio, no Recife, em Salvador, no Distrito Federal e em Porto Alegre. Como São Paulo interveio na cracolândia já em janeiro, com a PM, acabou não avançando nas discussões com o Planalto. A Secretaria de Justiça paulista informou que não teve acesso a nenhum documento federal com um cronograma para agir na cracolândia”.
SIM OU NÃO
Estadão propôs um debate: a intervenção deveria começar com a PM?
Sim. Eloisa de Sousa Arruda, secretária de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania, afirma que a Polícia Militar é fundamental para quebrar a estrutura logística do tráfico e coibir a atuação dos traficantes. O tráfico, diz, atrapalhava o trabalho dos agentes de saúde.
Não. Ana Cecília Roselli Marques, psiquiatra e pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisa sobre Drogas, diz que as ações na cracolândia de São Paulo são caóticas. A polícia, afirma ela, não compreende o papel que deve cumprir.
A PREGUIÇA
No artigo “A droga da preguiça”, dia 9, na Folha, o colunista Vinícius Mota começa com duas afirmações: “O crack é somente um sintoma da exclusão social, e não adianta tratar o efeito sem antes atacar a causa. A “criminalização” e a repressão são inúteis no combate às drogas”.
Diante delas, coloca que “felizmente, a sociedade brasileira passou a desconfiar dessas sentenças derrotistas. Cobra de autoridades, de especialistas e da imprensa modos de ação e raciocínio que possam equacionar questões prementes e circunscritas”.
“A internação involuntária de viciados não dá certo, dizem alguns desses doutores. Pesquisas mostram que o tratamento tem mais chance de sucesso com a adesão do paciente. Mas o expediente é efetivo em situações corriqueiras na cracolândia, em que a pessoa perdeu o senso da realidade. É mais humano levá-la à força e correr o risco de o tratamento falhar do que deixá-la definhar”, escreve Mota.
Na opinião dele, “tática contumaz do especialista preguiçoso é fazer-nos supor que todo problema é muito mais amplo do que parece”. “Não é preciso acabar com a exclusão social nem ter solução nacional para o crack a fim de melhorar bastante a situação calamitosa, mas específica, da cracolândia em São Paulo. O passo inicial é ajustar o foco e recusar a droga da preguiça, oferecida em qualquer esquina”.
A droga da preguiça vai além de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Salvador, Distrito Federal e Porto Alegre. Está até em cidadezinhas do interior do Brasil, aos olhos daqueles que preferem o preguiçoso “basta curtir”.
FRASES
“A crise atual não é inerente ao chamado “capitalismo”. Ela foi gerada por uma avalanche do pensamento único – o “neoliberalismo” -, apoiado por Estados corrompidos pelo sistema financeiro internacional”. Ex-ministro Delfim Neto, dia 11, na Folha.
“Acorde: só a economia é global. A vida, em geral, é tribal, de “panelas”. Entre ou fique fora delas”. Simplório Silva, um pensador irrelevante, parceiro deste blog.
“O nível de inadimplência não é preocupante, tanto que os bancos continuam emprestando. Se houvesse uma preocupação com relação ao futuro, eles estariam segurando o crédito”. Miguel de Oliveira, vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade, sobre a subida de 21,5% no calote de pagamentos em 2011, a maior alta em nove anos. (Folha, 11.)
TEXTO PUBLICADO ORIGINALMENTE EM
José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.

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