quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Analfabetismo e homens de bem

Na contramão da propaganda política, é possível perceber que o Brasil constrói  um difícil futuro para as próximas gerações, embora tenha registrado, nos anos de Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula da Silva, significativos avanços em todas as áreas.

Estado de S. Paulo (28/9/2013) escreve que o analfabetismo para de cair pela 1ª vez desde 2004. O assunto saiu em jornais no sábado, dia da semana que, em geral, as pessoas estão mais desatentas ao noticiário – não à toa, empresas costumam anunciar demissões ao final da sexta-feira. “A taxa de analfabetismo da população com 15 anos ou mais, porém, parou de cair e teve leve alta. Em 2011, ela era de 8,6%. Em 2012, chegou a 8,7% (mais de 13 milhões, calcula-se). Com isso, o País fica mais longe de cumprir a meta firmada na ONU de reduzir a proporção de analfabetos para 6,7% até 2015”, segundo dados do governo na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2012, que ouviu 362,4 mil pessoas em 147,2 mil domicílios de todos os Estados.
Destaques do estudo oficial preocupam:
Saneamento básico
42,9% dos lares brasileiros não têm coleta de esgoto.
Trabalho infantil
3,5 milhões de jovens de 5 a 17 anos trabalham no País, 4,2% menos que em 2011.
CONECTADO E ATRASADO
No mesmo sábado, o jornal Estado de Minas mostra, segundo o Pnad, “um país conectado, mas ainda atrasado”. Assim, entre os mineiros, o quadro é este:
“O percentual de adolescentes entre 15 e 17 anos na escola em Minas em 2012 era de 85,8%, superior à média nacional (84,2%). Na faixa etária de 18 a 24 anos, porém, só 27,6% dos mineiros estavam nas salas de aula, taxa pior que a brasileira, de 29,4%”.
Outros números:
Coleta de lixo
11% é o percentual da população mineira sem acesso. A taxa se assemelha à do Brasil: 11,2%.
Gravidez
10,3% é o índice entre mineiras de 15 a 19 anos. No Brasil aumenta para 14,4%.
Internet
Ah! O total de residências brasileiras ligadas à internet chegou a 40,3%. Não se revela o que fazem na rede – a maioria, talvez, trocando mensagens sobre celebridades e futilidades no Facebook, no Twitter, etc., ou falando sobre nada no celular (51,4% das residências do País têm somente celular), sem contar as novelas da televisão (97,2% dos lares do País possuem ao menos um aparelho de televisão).
(Sei, distração e entretenimento também são precisos…)
Ensino Fundamental
Porém, faz poucos meses, O Globo reportou que, entre maiores de 15 anos, só 55% dos brasileiros concluíram o fundamental. Eram 60% em 2000. Tem mais e todos sabemos: “a infraestrutura é outro problema que o país não conseguiu resolver: um em cada dez brasileiros gasta pelo menos uma hora no trajeto de casa até o trabalho”.
No mesmo jornal (11/8/2013), noticia-se: “Baixa qualificação: Juventude desperdiçada”. “Estudo do IBGE mostra que o desemprego em geral caiu 53,8% entre 2003 e 2013 nas seis maiores regiões metropolitanas; entre os jovens, a queda foi de 41,6%, informa Clarice Spitz. A qualificação ruim, alertam analistas, explica essa performance”.
Na economia, outras revelações do nosso atraso. “Quase 53 milhões de brasileiros não têm conta bancária, cartões ou poupança. Dá para confiar no cofrinho?”, escreve o Correio Braziliense (30/9/2013).
(Pré-sal, pré-sal…, fico a pensar.)
O Globo (29/9/2013) publica que a autossuficiência no refino da Petrobras, que faz 60 anos dia 3 de outubro, virá só em 2020.
ABAIXO A MERITOCRACIA?
Enquanto o percentual de adolescentes entre 15 e 17 anos na escola chega a 84,2%, na média nacional, e 29,4% na faixa etária de 18 a 24 anos, o Brasil vai se “perdendo no mérito”, na opinião de Gustavo H. B. Franco, escrita em O Estado de S. Paulo (29/9/2013).
“Parece haver algo de muito suspeito no reino das políticas públicas quando o talento, o das empresas e também o das pessoas, deixa de ser reconhecido e recompensado. A mensagem típica nas medalhas concedidas a estudantes e esportistas, “honra ao mérito”, vem caindo em desuso com enorme velocidade, e dando lugar a uma nova cultura que canhestramente utiliza os dogmas da inclusão e da igualdade em detrimento de qualquer distinção pelo mérito; premiações e bonificações têm sido crescentemente tratadas como formas neoliberais de discriminação”.
Franco explica que o princípio será útil para os que precisarem explicar a seu filho adolescente que ele não vai entrar na universidade pública a despeito de uma boa nota do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), pois a regra das quotas é tal que seu lugar será de alguém com o desempenho escolar muito pior. (…)  “No caminho de nossa maior prioridade, o crescimento, há uma pedra, a produtividade, que permanece estagnada e nossos sindicatos não permitem que seus acordos coletivos incluam cláusulas prevendo remuneração proporcional ao desempenho. De onde pode vir o incentivo a fazer mais e melhor? As bonificações têm sido um tema muito contencioso, por exemplo, nas negociações com sindicatos de professores, que resistem a esquemas remuneratórios que utilizem metas e avaliações. O noticiário sobre a greve dos professores do município do Rio de Janeiro registrou diversas faixas com dizeres como “abaixo a meritocracia”. A que ponto chegamos”.
Acrescento mais um trecho do artigo: “No terreno das empresas, a ideia de meritocracia vai pior ainda. O Brasil ocupa a posição 130 de 185 países em termos de “ambiente de negócios”, segundo o Banco Mundial, e a posição 100 em 177 países em “liberdade econômica” segundo o Wall Street Journal. E tem estado assim nos últimos 5 ou 10 anos sem nenhuma indicação de mudança”.
Gustavo Franco conclui que se o mérito não readquirir precedência, para pessoas e empresas, não vamos a lugar algum.
O cenário e a expectativa de futuro melhor são preocupantes. Como li recentemente, talvez o irlandês Edmund Burke tivesse razão quando afirmava que “o mal só triunfa quando os homens de bem nada fazem”.
José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.
E-mail: joseaparecidomiguel@gmail.com
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segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Incontroláveis

“Black Blocs – Depredação nas ruas” é o principal destaque da revista Carta Capital (7 de julho de 2013,data de capa), para quem o termo surgiu de forma confusa na imprensa nacional. “Seriam jovens anarquistas anticapitalistas e antiglobalização, cujo lema passa por destruir a propriedade de grandes corporações e enfrentar a polícia. Na capa dos jornais e na boca dos âncoras televisivos, eram a “minoria baderneira” em meio a “protestos que começaram pacíficos e ordeiros”. Uma abordagem simplista diante de um fenômeno complexo”, escreve.
“O que nos motiva é a insatisfação com o sistema político e econômico”, diz Roberto (nome fictício), 26 anos, e três Black Blocs na bagagem. Segundo a revista, ele não se identifica por razões óbvias: o que faz é ilegal.
PALAVRA E VIOLÊNCIA
Durante os atos de junho, destaca, não faltaram críticas: eles só seriam válidos se pacíficos. “Mas como protestar pela palavra se é ela o suporte por meio do qual o Estado de Direito exerce violência?”, indaga o professor de teoria política Nilo Avelino, do Grupo de Estudos e Pesquisas Anarquistas da Universidade Federal da Paraíba.
A denominação surgiu na Alemanha nos anos 80. Em 1999, manifestaram-se com violência em Seatle (EUA), quando a Organização Mundial do Comércio ali se reuniu. “Tais manifestações tendem a ocorrer cada vez mais desse jeito: instantâneas, acéfalas, impossíveis de controlar. Como não são uma organização, mas uma tática condicionada a contextos políticos, os Black Blocs devem surgir com mais freqüência”, prevê a reportagem de Carta Capital.
Derrick Jensen (ativista ambiental), a voz mais crítica sobre os Black Blocs, é taxativo: para quem busca alcançar conquistas sociais concretas, a tática é um desserviço. “Atos gratuitos de destruição com espírito de carnaval não vão arranhar o capitalismo”, defende. “É preciso estratégia, objetivos. E certa ética”.
ASSASSINOS
Veja desta semana (dia 7, data de capa) revela pesquisa exclusiva sobre “Assassinos ao volante – As mortes no trânsito no Brasil já superam os crimes de homicídio”, um efeito do desrespeito às leis e da má qualidade dos motoristas. Em 2012, ocorreram 60.752 mortes no trânsito do país. “Os acidentes matam, em um ano, tanto quanto a guerra civil na Síria nos últimos 20 meses; a guerra do Iraque em 3 anos; a guerra do Vietnã em 16 anos (apenas militares americanos).
O Brasil tem a quinta maior taxa de mortes no trânsito do planeta, segundo o Ministério da Saúde. Pelas estatísticas do DPVAT (Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre), o seguro do trânsito, o Brasil é campeão mundial, seguido do Catar, de El Salvador, de Belize e da Venezuela. “Os jovens são as principais vítimas. Do total de mortos no trânsito em 2012, 41% tinham entre 18 e 34 anos de idade (isso equivale a 2 tragédias como a da Boate Kiss em Santa Maria por semana; ao dobro do número de médicos formados anualmente no país).
“A NEGAÇÃO DA JUSTIÇA”
Veja dedica também três páginas ao artigo “A negação da Justiça”, do colunista J. R. Guzzo. Trecho: “Soma-se a isso o entendimento, cada vez mais aceito em nosso mundo jurídico e político, de que a ideia da responsabilidade individual, em pleno vigor em qualquer país civilizado, se tornou obsoleta no Brasil. Aqui, segundo nossos magistrados e legisladores, o indivíduo não deve ser considerado responsável por seus atos. Quando mata, rouba ou sequestra, a culpa não é realmente dele. É da pobreza em que nasceu, da família que não o apoiou, da publicidade que estimula o consumo de coisas que não pode comprar, dos traumas que sofreu, das boas escolas que não teve, dos empregos mal pagos, das vítimas que possuem dinheiro ou objetos desejados por ele, do alto preço dos jeans, tênis e iPhones – enfim, de tudo e de todos, menos dele. E os milhões de brasileiros que têm origens e condições de vida exatamente iguais, mas jamais cometem crime algum – seriam anormais? Não há resposta para observações como essa”.
O resultado está à nossa volta, todos os dias. Vivemos num país que tem 50 000 homicídios por ano – o equivalente, no mesmo período, ao número de mortos na guerra civil na Síria, a mais selvagem em curso no mundo de hoje, escreve Guzzo. “Estimular essa barbaridade toda com leis que multiplicam ao infinito os direitos de assassinos e dificultam ao extremo sua punição, como fazem os poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, é agredir a democracia e a Constituição brasileira, que garantem a todos, e acima de tudo, o direito à vida. É negar a liberdade, ao fazer com que o cidadão corra o risco de morrer todas as vezes que sai de casa, ou mesmo quando não sai. (…) É ou não para ter medo?”
ESPIONAGEM AMERICANA
Época também divulga documento exclusivo, sobre espionagem dos Estados Unidos, e destaca, na capa, “De onde vem a maldade – Novos estudos mostram porque há tanta gente com Félix, o vilão da novela Amor à Vida”.
A revista revela que uma carta ultrassecreta, assinada pelo atual embaixador dos Estados Unidos no Brasil (Thomas A. Shannon Jr, então secretário-assistente do Departamento de Estado e responsável pelo escritório no Hemisfério Sul), mostra como o governo americano se beneficiou das ações da NSA (Agência Nacional de Segurança) na Cúpula das Américas de 2009.
“Em nome do Departamento de Estado, gostaria de expressar meus agradecimentos e dar parabéns pelo especial apoio da inteligência de sinais (captação de informação digital) que recebemos da Agência Nacional de Segurança, na preparação e conclusão da Cúpula das Américas (de 17 a 19 de abril de 2009). Os mais de 100 relatórios que nós recebemos da NSA nos deram uma compreensão profunda dos planos e intenções de outros participantes da Cúpula (…)”.
O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, considera o episódio um escândalo de proporções globais. “Acha que houve escuta de conversas de diplomatas no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas e propõe uma governança multilateral na internet. (…) No governo, não tratamos de assuntos reservados ao telefone”.
MALDADE
A respeito de maldade, Walcyr Carrasco, o autor de Amor à Vida, escreve emÉpoca sobre a criação do personagem Félix.
“Por que não um gay cruel? (…) Não admito o ‘politicamente correto’. Pessoas são pessoas. Arrisquei. Criei o vilão gay que vive no armário. Mas num armário ruído por cupins. Ele desmunheca, fala vaidades, é invejoso (…). Recentemente, declarei que sou bissexual. Fui apedrejado por homossexuais, segundo os quais deveria ter me declarado gay. (…) Bastou isso para os jornalistas perguntarem se a experiência bissexual foi a base da criação do Félix. Respondi, sempre: Então, para escrever um livro policial, é preciso cometer um assassinato? (…) Félix  não é uma bandeira a favor ou contra os gays. Cada ser humano tem o direito de escolher sua vida, desde que não prejudique o próximo”.
MELATONINA
IstoÉ (dia 7, data de capa) dá capa para “Melatonina – O super-remédio” e destaca, entre outros temas, “o fogo ‘amigo’contra a presidente Dilma Rousseff”. A revista reporta que recentes estudos provam que a melatonina faz muito mais que ajudar a dormir. Substância fabricada naturalmente pelo organismo, o hormônio é eficaz contra uma ampla gama de enfermidades. “Só para ter uma idéia, a melatonina ajuda a emagrecer, protege contra os danos causados pelo acidente vascular cerebral, auxilia no controle da hipertensão e da diabetes e reduz as crises de enxaqueca”, além de “diminuir a queda de cabelo, provocada por causas genéticas”.
Dose recomendada: máximo de 5mg. por dia. IstoÉ esclarece que a melatonina não é indicada para gestantes e mães em fase de amamentação. (Outras Páginas sugere consulta médica antes de usar remédios.)
PT x DILMA
No texto “O PT contra Dilma”, a mesma IstoÉ reporta que a relação entre a presidente e o partido nunca foi tão tensa. “Envolvidos na contenda política torcem para que os diálogos entre Dilma e Lula possam levar a um consenso sobre 2014(ano de eleição presidencial)”. Três divergências: “1- Petistas estão em campanha pela regulamentação da mídia. Dilma é contra. 2-Petistas criticam Guido Mantega (Ministro da Fazenda) e medidas da política econômica. Dilma sustenta Mantega e defende sua política. 3- Petistas querem debater rumos gerais do governo. Dilma recusa, alegando que querem colocar ‘uma faca no seu pescoço’”.
Frases
CONFIANÇA – “Fechamos o primeiro semestre com 30 bilhões de dólares em investimentos estrangeiros diretos. Se isso não é confiança, eu não sei o que é. Não acredito que os investidores tenham um instinto suicida”.
Guido Mantega, ministro da Fazenda, em entrevista à revista Veja, onde declara que “a pior coisa para o Brasil é a inflação”.
DELINQUÊNCIAS – “Vivemos imersos num mar de pequenas delinqüências cotidianas que já não notamos, ou então achamos que fazem parte natural e inevitável da vida”.
João Ubaldo Ribeiro, escritor, no artigo “Nós, os desordeiros”, publicado naVeja.
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José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.
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quarta-feira, 31 de julho de 2013

Superpreocupante

Reportagem “Quanto custa um país”, da revista Superinteressante, revela um cenário muito difícil para o futuro do Brasil.

O Brasil melhora! Contente-se, mas preocupe-se com o amanhã. No mesmo dia (30 de julho de 2013) em que se divulga que Índice de Desenvolvimento Humano dos municípios brasileiros subiu 47,5% - e vai de 'muito baixo' para 'alto' em duas décadas, em longevidade da população e renda, mas quase 30% das cidades brasileiras têm nota considerada "muito baixa" em educação -, o noticiário destaca fatos assim:

Expansão do PIB segue em 2,28% (O Estado de S. Paulo).

Vendas de shoppings desaceleram (Valor Econômico).

Sobrepreço de R$ 2 bilhões na refinaria - Segundo o TCU, obra em Suape incluiu serviços não previstos originalmente por causa de erros cometidos pela Petrobras. (Jornal do Commercio-PE)

Fortuna de famílias ricas é, na média, de R$ 9,4 milhões.  Existem no Brasil 5.732 famílias ricas (na média, menos de 1 por município, calculo) que investem seus recursos por meio dos gestores de patrimônio. (Há outras alternativas, acrescento.) (Valor Econômico)

Surto de diarréia - Além do Sertão, cidades da Zona da Mata estão sofrendo por conta da má qualidade da água. (Jornal do Commercio-PE)

Plástico ou cimento? Surubim, município de 60 mil habitantes no interior de Pernambuco, começou a receber nos últimos dois meses 1.300 cisternas de polietileno, doadas pelo Ministério da Integração Nacional no âmbito do programa Água para Todos. Muitas estão armazenadas no campo de futebol da cidade. (O uso de cimento está em debate.)(Valor Econômico).

Paulista ganha 21 vezes mais que maranhense (O Estado de S. Paulo).

Falta de regra deixa R$ 18 bilhões de elétrica sem dono. Patrimônio hoje não está mais no balanço das companhias nem da União. (Brasil Econômico).

Ônibus caro: Tarifa acima da inflação no Interior. Em 10 anos, nove maiores cidades fora da Grande Porto Alegre tiveram aumento médio de 105,29%. (Zero Hora-RS)

Fila de banco - O Tribunal Regional Federal da 1ª Região reverteu decisão de primeira instância e considerou constitucional lei municipal de Manaus que estipula tempo máximo 45 minutos de espera dos clientes para atendimento em bancos. (Valor Econômico).

Que falta faz uma escola padrão Fifa – Educação é o  único quesito que ainda não atingiu um patamar considerado alto, apesar de registrar a maior evolução do período (128%). Puxada, vale ressaltar, por mais matrículas, o que não significa um ensino melhor. (Correio Braziliense).

No Brasil, o sistema educacional investe apenas US$ 2.900 por aluno. É três vezes menos que o Reino Unido, e seis vezes menos que os Estados Unidos, segundo a revista Superinteressante de agosto.

Na Folha de S. Paulo, Eliane Cantanhêde escreve que o IDHM confirma que o Brasil, mesmo que aos trancos e barrancos, vai no bom caminho. (...) “O carioca Fernando Henrique e o pernambucano Lula saíram para o Planalto e para mudar a cara do país. Um porque combateu a inflação, elevou o patamar internacional do país, botou a casa em ordem na economia e deu o "start" em programas sociais cruciais. O outro porque manteve uma política macroeconômica saudável e transformou o grande momento mundial em oportunidade para uma inclusão social histórica. (...) Há muito ainda a fazer, principalmente na educação. O último lugar em desenvolvimento humano foi Melgaço (PA), onde metade da população não sabe ler nem escrever. Enquanto houver "Melgaços" no Brasil, gritemos. Oba-oba os governantes já fazem à exaustão”. 

EXPANSÃO DO PIB MINGUA

Na véspera da divulgação do IDHM, o editor de Economia do Correio Braziliense, Vicente Nunes, escreve, na coluna Brasil S. A., “de que adiantará levar adiante a onda de desconfiança (com a equipe econômica) que vai impor ao país o terceiro ano consecutivo de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) inferior a 2%?”.

(O PIB é o resultado de tudo o que o país produz, acrescento.)

“Economistas como Tony Volpon, da Nomura Securities, apostam que, na melhor das hipóteses, a expansão da atividade neste ano será de 1,6%. Nilson Teixeira, do Credit Suisse, fala em 2%, mas com viés de baixa. Não se pode esquecer que, em 2012, quando o mesmo Teixeira falou que o PIB avançaria 1,5%, Mantega classificou a projeção como piada. O resultado foi ainda pior: 0,9%”, acrescenta Nunes.

SOMOS POBRES

Por que é superpreocupante?

A Superinteressante, edição de agosto, na reportagem “Quanto custa um país”, de Andreas Müller, Ricardo Lacerda e Bruno Garattoni, editada por Bruno, escreve que o Brasil é o país dos impostos. “E da corrupção. Os políticos roubam muito, e por isso os serviços públicos são ruins. Tudo isso é verdade. Mas não é toda verdade”

O governo, segundo o texto e o infográfico do design Jorge Oliveira, arrecada pouco. “São US$ 4.085 por habitante, por ano – é o que tem para gastar com todos os serviços públicos prestados a cada pessoa. (...) Hospitais, universidades, escolas, polícia, cadeias, tribunais, ruas, estradas, portos, investimentos...

(...) US$ 4.085 (número em dólar, já corrigido pela paridade do poder de compra) parece bastante, só que não é. Países desenvolvidos arrecadam pelo menos o triplo de dinheiro por habitante (os Estados Unidos, US$ 13.429 por ano). Suécia e Noruega arrecadam até cinco vezes mais que o Brasil. Até países subdesenvolvidos, como Argentina e México, arrecadam mais dinheiro do que nós”, escreve a revista.

O Brasil é a sétima economia do planeta. Só que essa produção, segundo a Superinteressante, é dividida por um país com 197,4 milhões de pessoas, a quinta maior população do mundo. “Nosso PIB per capita é de apenas US$ 11,8 mil por habitante, o que nos dá o nada honroso 74° lugar no ranking mundial”.

Margarida Sarmiento Gutierrez, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e especialista em finanças públicas, afirma que o Brasil tem um desempenho de país pobre. “Isso significa que, para cada indivíduo que paga muito imposto sobre salário e sobre os produtos que consome, há um monte de pessoas que pagam pouco – porque ganham pouco e consomem pouco. O problema é que o salário médio de contratação, segundo dados do Ministério do Trabalho, é de R$ 1.011. Renda de país pobre, que gera arrecadação de país pobre – e serviços de país pobre. Para piorar, os ricos também pagam pouco imposto”, diz na reportagem.

SOLUÇÕES DIFÍCEIS

Superinteressante propõe quatro soluções. A primeira é acelerar o crescimento da economia. “Se o Brasil dobrar seu PIB per capita (US$ 11,8 mil), dobrará o dinheiro disponível para serviços públicos. Ainda assim ficaríamos bem atrás dos países desenvolvidos, mas alcançaríamos a Coréia do Sul, um bom exemplo de país emergente. Para que isso aconteça, o Brasil precisaria crescer 4,7% ao ano durante os próximos 17 anos. Não é nada de outro mundo. A China, por exemplo, conseguiu crescer em média 9,5% ao ano durante 24 anos seguidos”.

(Recordo que o Brasil poderá ter, em 2013, o terceiro ano consecutivo de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) inferior a 2%.)

Outra saída proposta é a busca de novas fontes de energia. A maior delas é o petróleo do pré-sal. “Somando royalties e outras compensações, ele deverá render até R$ 108 bilhões ao governo federal e R$ 171 bilhões para Estados e municípios.

(Todo potencial do pré-sal precisa ainda ser explorado, ressalvo eu. No mais, é torcer, segundo o engenheiro e consultor Humberto Viana Guimarães, para que os campos leiloados na 11ª Rodada (14/05/13) comecem a produzir o mais rápido possível e que o pré-sal torne-se realidade, para que em 2028 possamos, por fim, comemorar sem factóides e ufanismos eleitoreiros, a tão sonhada autossuficiência na produção de petróleo”).

A terceira proposta seria aumentar a tributação. “Se quisésssemos ter mais investimento público, teríamos de aumentar mais ainda a carga tributária”, afirma o economista Darcy Francisco Carvalho dos Santos, especialista em finanças públicas. Superinteressante escreve que a equação é complexa, mas há pistas de como solucioná-la. “No Brasil, 45% da arrecadação tributária vem de impostos cobrados sobre as coisas que consumimos. Nos países ricos, a média é 29%. Conclusão: nós taxamos demais nossos produtos”.

“Os tributos que incidem sobre o consumo são os mesmos para pessoas ricas e pobres”, diz João Eloi Olenike, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBTP). Uma possível saída é reduzir essas taxas, e compensá-las criando alíquotas mais altas de imposto de renda – a máxima, no Brasil, é de 27,5%, “um valor extremamente baixo pelos padrões internacionais”. Praticamente todos os países têm alíquotas mais altas que incidem sobre o cidadão de maior renda. (Estados Unidos, Chile e África do Sul, entre 35% e 40%.)

A quarta iniciativa seria usar o dinheiro de impostos de maneira mais inteligente - e mais honesta, propõe a Superinteressante. A começar pelo dinheiro que o governo gasta consigo mesmo. “Se o Congresso reduzisse seus gastos para o mesmo nível do México, seria possível economizar R$ 7,3 bilhões por ano – muito mais do que está sendo gasto com todos os estádios da Copa do Mundo”.

Isso sem falar na corrupção. Um levantamento da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo estima que, a cada ano, o Brasil perca pelo menos R$ 41,5 bilhões por causa dela. (...) “Somos “apenas” o 69° no ranking das 180 nações mais corruptas do mundo”. (...) Estudo do Banco Mundial aponta o Brasil como o vice-campeão em sonegação (US$ 280 bilhões, quase o dobro de tudo o que entra via imposto de renda, por exemplo.) Com o dinheiro da sonegação, seria possível quintuplicar os gastos federais em saúde e educação.

DIFICULDADES

Superinteressante conclui que é muito difícil, ou impossível, acabar com a sonegação. “Também é muito difícil fazer o país crescer 4,7% ao ano por 17 anos. É muito difícil matar a corrupção. É muito difícil aumentar os impostos dos ricos – ou convencer os congressistas a reduzir seus próprios salários. Tudo isso é muito difícil. Mas fazer uma combinação dessas coisas, aplicando um pouco de cada remédio, talvez não seja tão difícil assim”.

A reportagem da Superinteressante, edição 321, de agosto, ocupa seis páginas.

José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.

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domingo, 28 de julho de 2013

De volta à realidade?

Enquanto o papa Francisco, numa visita histórica ao Brasil, reza, evangeliza, abraça, beija e ataca a corrupção, seguem as revelações de danos milionários do pagamento de propinas no Brasil, os Estados Unidos aparece em novo caso de espionagem, e o governador Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro, sofre forte desgaste com manifestações de protesto.

Francisco, obviamente, dominou o noticiário da semana passada em todos os meios de comunicação do país. Continuará repercutindo por mais alguns dias. Ganhou de Veja (31 de julho, data de capa) o que a revista chama de edição comemorativa. “Papa Francisco no Brasil – “Quero que a Igreja vá para as ruas”, destaca.

ESPIONAGEM

Época (dia 31, data de capa) traz, com exclusividade, “A espionagem digital dos Estados Unidos” – o governo americano espionou oito países, entre eles o Brasil, para aprovar sanções contra o Irã nas Nações Unidas.

O governo do presidente Obama dera sinal verde para Brasil e Turquia negociarem com o Irã (sobre enriquecimento de urânio, vetado por acordo internacional). Em seguida, passou a demonstrar ceticismo com a negociação. “Espionou as delegações de outros países, trabalhou pelas sanções e vendeu. O Brasil ficou do lado perdedor”.

A operação de espionagem foi um sucesso. Deu aos Estados Unidos “uma vantagem nas negociações”, segundo a então embaixadora do país na ONU, Susan Rice. “Me ajudou a saber se outros integrantes permanentes (do Conselho de Segurança da ONU) estavam dizendo a verdade”. O Itamaraty não quis se pronunciar a respeito, registra Época.

SUPERFATURAMENTO

Também como exclusivo aparece o conteúdo de IstoÉ (dia 31, data de capa). A reportagem é sobre o chamado “Escândalo no Metrô” paulista – “A fabulosa história do achaque de 30%”. Segundo a revista, ao analisar documentos da Siemens, empresa integrante do cartel que drenou recursos do Metrô e trens de São Paulo, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e o Ministério Público concluíram que os cofres paulistas foram lesados em pelo menos R$ 425 milhões.

“Empresas do cartel (denunciadas pela própria Siemens) se associaram para vencer a licitação da fase 1 da Linha 5 Lilás do metrô paulista. Para obterem o contrato, orçado em R$ 615,9 milhões, elas teriam dado 7,5% de propina. Três contratos investigados até agora pelo Cadê o sobrepreço. Dois na Linha 2 Verde e um na 5 Lilás – um superfaturamento de R$ 252 milhões. Acordos entre o cartel e a estatal CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) indicam prática de preços 30% superiores aos normalmente praticados em quatro projetos (superfaturamento de R$ 173,1 milhões)”.

Na coluna Radar, de Veja, Lauro Jardim escreve a nota “Da Siemens para Itajubá”. “Adilson Primo, que comandou a Siemens durante anos e foi demitido da presidência por suspeita de fraude, trabalha hoje na Secretaria de Administração e Gestão da pacata Prefeitura de Itajubá, Minas Gerais. Se quiser, pode ajudar – e muito – na delação premiada que a empresa propôs ao Ministério Público de São Paulo sobre um esquema de cartel em licitações públicas feitas por governos tucanos no estado”.

“FOMOS OMISSOS”

Na mesma edição sobre o cartel, IstoÉ entrevista o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, apresentado como um dos mais fiéis auxiliares do ex-presidente Lula. “Fomos omissos” é o título do texto de Paulo Moreira Leite. “Ministro diz que governo tem muitas conquistas, mas se acomodou e não deu respostas para questões urbanas graves, aumentando o mal-estar da população”.

BRASILEIRO LIMITADO?

A escritora Lya Luft, colunista da Veja, não acha graça quando dizem que alguma falha, bizarrice, relaxamento ou incompetência é o jeito brasileiro. “Não concordo quando autoridades dizem que atrasos em ocasiões oficiais fazem parte da cultura brasileira... Não acho que errar o trajeto ou combinar mal ou nem combinar nada sobre o trajeto de um papa, sabido séculos antes, nas tantas vezes convulsionadas ruas do Rio atual, seja apenas jeito brasileiro. E, se for, a gente tem de corrigir”.

Seu artigo, “O jeito brasileiro”, segue:

“No Brasil é assim...”. “Será? Será bom? A gente deve achar graça e se orgulhar? Houve um momento em que uma autoridade afirmou que caixa dois no Brasil é normal. Será? E então como falar de ética, honradez, transparência, palavras que se vão gastando de tão mal usadas?”, questiona Lya Luft, que me fez lembrar o fato seguinte.
Na semana passada, em rádio de São Paulo, pela manhã, correspondente do Rio de Janeiro, de quem infelizmente não guardei o nome, disse que o brasileiro não tem raciocínio para a diversidade. Vive à base de fazer “uma coisa de cada vez”, falou. Não é capaz, de pensar um evento no Maracanã e suas variáveis, como vias de circulação, utilização de banheiros etc. Foi por aí. Ou seja, segundo ela, o brasileiro ainda é um atrasado, um limitado, para eventos de grande porte.

(Observo que, no geral, o que coube à Igreja organizar – com a participação de milhares de brasileiros, milhares de leigos de múltiplas atividades – foi impecável.)

O VILÃO DA HORA

Para a CartaCapital (dia 31, data de capa), no Rio de Janeiro, Sérgio Cabral é o vilão da hora. “O governador pior avaliado do país perde o controle da situação”, escreve em manchete. Ele “ignora o recado das ruas, continua a reprimir os manifestantes e é o administrador mais reprovado do Brasil”.

Na mesma edição, Marcos Coimbra, colunista da revista, sociólogo e presidente do instituto Vox Populi, analisa as pesquisas pós-manifestações.

“Tudo considerado, Dilma (Rousseff, presidente) mantém-se favorita (para as eleições presidenciais do ano que vem). “Se é verdade, que Dilma desceu, é também verdade que nenhum de seus adversários efetivos subiu. Apenas Marina Silva teve desempenho positivo. (...) Muita gente admira Marina, mas poucos ficam confortáveis a imaginá-la no cargo”, opina Coimbra, em CartaCapital.

O QUE TEMOS DE BOM

“Francisco, sendo argentino, sabe onde se meteu, que continente é este, que país é este, e deve amar o que temos de bom, de belo, de honrado, de afetivo, de alegre, de bravo, de resistente e firme”. Lia Luft, na Veja.

RECOMENDACÕES

Segundo o jornal Estado de Minas, dia 28, em “Os dez mandamentos de Francisco”, o papa, que levou mais de 3 milhões de fiéis à orla de Copacabana, na véspera, depois de uma série de compromissos no Rio, deixa 10 recomendações aos brasileiros. “A maioria do conteúdo é um dedo na ferida aberta entre a sociedade e os políticos desde os protestos de junho e vai ao encontro do que o povo pede nas ruas. Prega, entre outras coisas, o combate à fome e à miséria, o fim da corrupção, a prática da humildade, o amor a Deus, o cultivo da solidariedade e de valores”.

BURRICE

“Esperar do papa Francisco uma ruptura com o dogma e a moral do cristianismo em sua versão católica é mais que um despropósito: é uma burrice. Ele está comprometido pela fé e pelo seu estado sacerdotal com um corpo de doutrinas que atravessou mais de 2.000 anos e pelo qual foi eleito não democraticamente, mas legitimamente pelos representantes da comunidade católica universal”.  Carlos Heitor Cony, escritor, conhecedor de Igreja, na Folha de S. Paulo (27 de julho).

“PRESTO ATENÇÃO”

“Não comento pesquisa. Nem quando sobe nem quando desce [puxa a pálpebra inferior com o dedo]. Eu presto atenção. E sei perfeitamente que tudo o que sobe desce, e tudo o que desce sobe”. Dilma Rousseff, em entrevista a Monica Bergamo, na Folha de S. Paulo (28), para quem falou ainda que “Lula não vai voltar porque nunca saiu (...). Eu e Lula somos indissociáveis”.

“ESSE PAÍS É O BRASIL”

“Considere um país que está entre os dez mais violentos do mundo: um dos países onde mais se morre por causa de tiro”, escreve Vinicius Torres Freire, em “Aquarela sangrenta do Brasil”, na Folha de S. Paulo deste domingo, 28 de julho. 

“Nesse mesmo país, a população adulta mal passou da escola primária, em média. Nas estatísticas mundiais de anos de instrução, esse país está para lá de centésimo lugar numa lista de 185 nações”. 

“Esse país fantástico também é um dos dez mais desiguais em termos econômicos (de renda individual, mas não apenas). Esse país é o Brasil”. 

(...) “Por ninharias, o brasileiro rasga a fantasia fina de civilização e atira: é tosco e tem uma arma à mão para cometer barbaridades (quando não tem arma de fogo, tem um automóvel: somos um dos povos que mais se mata também no trânsito). 

“Desigualdade de renda, social, de poder, violências, falta de educação: há algo de anormalmente errado com o Brasil.
O "gigante" precisa acordar para isso”.

DIA MUNDIAL DA PRIVADA

“A diversão e o riso que possam seguir a designação de 19 de novembro como Dia Mundial da Privada já terão sido úteis se chamarem a atenção para o fato de que 2,5 bilhões de pessoas não têm saneamento básico”.

Trecho de comunicado da ONU (Organização das Nações Unidas), que oficializou a data para alertar para a realidade de 1,1 bilhão de pessoas que não tem sequer acesso a banheiros. (O planeta alcançou 7,03 bilhões de habitantes em abril de 2012, segundo o Fundo de População das Nações Unidas.) Fonte: Veja.

OPÇÃO

“Entre a indiferença egoísta e o protesto violento, há uma opção sempre possível: o diálogo”. Papa Francisco, no Correio Braziliense, dia 28.

PARA TERMINAR - Papa despede-se do Brasil. O Brasil, nesta semana, sem choro, nem vela, cai na sua pobre realidade, de suas mazelas, de muita fumaça, propaganda e pouca ação, da faminta base aliada etc. Há previsão de novos protestos, com suas mensagens. O Brasil cai na realidade?

José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.


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quarta-feira, 24 de julho de 2013

Além do papa Francisco

Retomo meu blog na semana em que o papa Francisco visita o Brasil. Francisco é capa de três das quatro mais destacadas revistas de informação do país (data de capa, 24/7/2013). Na Veja, com a manchete “O papa dos pobres”; na CartaCapital, “O papa renovador”, e na Época, “10 lições de vida do papa”.

IstoÉ optou por reportar sobre “O propinoduto do tucanato paulista”, revelando “documentos exclusivos” sobre esquema de corrupção montado há quase vinte anos para desviar dinheiro de obras do metrô e dos trens metropolitanos de São Paulo, em conexões em paraísos fiscais, pagamentos para empresas de fachada e saques na boca do caixa. Parte do cartel, a Siemens denunciou o esquema, que envolve multinacionais e já arrecadou pelo menos R$ 50 milhões, segundo a revista.
IstoÉ destaca ainda uma matéria de saúde – “A mais importante vitória contra a Síndrome de Down” – e outra sobre tortura, “Por que o Brasil mantém em suas delegacias as mesmas práticas que massacraram presos políticos”.
CONCHAVOS
Além do papa, Veja traz o texto “O rato roeu o ronco da rua”. Segundo a revista, “dinheiro público para financiar campanhas políticas, proteção aos mensaleiros, ajuda aos fichas-sujas, truques para escapar dos julgamentos do Supremo Tribunal Federal… As pragas tradicionais voltaram a roer a pauta do Congresso Nacional. (…)
Na semana passada, escreve a revista, a agenda positiva do Parlamento sofreu um ataque especulativo de pragas que surgiram de muitos lados. No lugar da pauta sintonizada com a sociedade, que previa ações contra políticos condenados e maior transparência nos procedimentos do Legislativo, moveram-se propostas destinadas a fragilizar a legislação eleitoral e favorecer os conchavos com o dinheiro público”.
CLASSE MÉDIA?
Classificar vastos contingentes da população como de “classe média”, em vez de “pobres”, faz qualquer governo parecer mais eficaz. No texto “E você, é da classe média?”, a revista Época escreve que a consultoria Ernest & Young (EY) chegou a uma definição própria, a partir de estudos iniciados em 2010 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
“Num relatório recente, a EY denomina como pertencentes à “classe média global” os indivíduos com rendimento diário entre US$ 10 e US$ 100, uma renda mensal equivalente, agora, à faixa entre R$ 660 e R$ 6.600. O governo brasileiro considera de classe média os cidadãos com renda entre R$ 291 e R$ 1.019 (definição dada em 2012 pela Secretaria de Assuntos Estratégicos, ligada à Presidência da República). Pelo critério do governo, a classe média é maioria no Brasil: 53% dos habitantes. Pelo critério da EY, encolhe para 41%, e os pobres são a maior parte da população”.
Época considera que o critério da EY é tão atacável quanto qualquer outro. “Tem a seu favor o objetivo de aplicação prática: presente em 140 países, a consultoria tem de orientar seus clientes, interessados unicamente em vender”.
Para o Banco Mundial, pertence à classe média quem tem rendimento diário entre US$ 2 e US$ 13 (o equivalente a uma renda mensal entre R$ 132 e R$ 858).
CONSELHEIROS
CartaCapital, em editorial de Mino Carta, afirma que o Brasil precisa de melhores escolhas e a presidenta Dilma, de conselheiros mais competentes.
“Saio de trem-bala. É um objetivo da presidenta Dilma. Ou seria o caso de dizer xodó? Ela o quer a todo custo, para ser preciso 50 bilhões de reais, à velocidade de 200 milhões por quilômetro construído. Agora vejamos. São Paulo, uma das cidades mais caóticas do mundo, dispõe de 70 quilômetros de metrô. Tivesse 300, a vida do paulistano melhoraria extraordinariamente”.
O jornalista explica que as recentes manifestações de rua alegavam entre seus motivos os gastos exorbitantes para a realização da Copa das Confederações, enquanto, por exemplo, mais da metade da população não é alcançada pelo saneamento básico. “Se os propósitos das passeatas frequentemente pareciam obscuros, este seria nítido e justificado. Como a queixa contra o aumento das passagens de ônibus. E nem teríamos como decente, aceitável em um país democrático e civilizado, um transporte público como o nosso mesmo fosse de graça”. Segundo o editorial, até anteontem, ou pouco mais, o Brasil era apontado mundo afora como um país de progresso acelerado”.
“O mundo costuma enganar-se em relação ao Brasil, na mesma medida em que o Brasil se engana em relação ao mundo. A globalização tem suas falhas. O mundo não sabe, por exemplo, que há 20 anos empresas brasileiras produziam eletrodomésticos de excelente qualidade e hoje não mais. Erros de política econômica desencadearam efeitos fatais para a nossa indústria, e não bastam as perspectivas do pré-sal para apresentar o País como terra prometida”.
A revista se posiciona. “Um ano e um mês e meio antes das eleições, CartaCapital abala-se a afirmar que a continuidade de Dilma é, na nossa opinião, da conveniência do Brasil. Permite-se esperar, contudo, que a presidenta seja menos irrecorrível nas suas decisões, ou, por outra, aberta ao benefício da dúvida e, portanto, ao reestudo em busca da solução certa. E que, rapidamente, escolha conselheiros mais competentes”.
VOTO DISTRITAL
“O voto distrital com “recall” é a reforma que inclui todas as outras reformas. São “eles” que passam a ter medo de você, e não o contrário. (…) A expressão tem exatamente o mesmo sentido e propósito em política e em administração pública que tem no comércio de automóveis: “Troque o seu político com defeito (de caráter, de comportamento, de desempenho) por outro novo antes que ele provoque um desastre”.
Trecho de artigo do jornalista Fernão Lara Mesquita, publicado na Folha de S. Paulo, dia 23/7/2013. Mesquita é um dos acionistas do jornal O Estado de S. Paulo. Link do artigo na íntegra:
REVOLUÇÃO
“Questões como esquerda e direita estão superadas. Quem deflagrou tudo isso (manifestações de protesto) foi a classe média. Quem faz a revolução é a classe média”.
Ferreira Gullar, poeta, jornalista, um dos organizadores da Passeata dos Cem Mil, em 1968, em entrevista para a IstoÉ.
AMERICANOS
“Agora vem o governo fazendo cara de que nunca soube. Mentira”.
Fernando Francischini, deputado federal (PEN-PR) e ex-delegado da Polícia Federal, dizendo, em Veja, que as autoridades brasileiras sempre souberam das ações (de órgãos de inteligência) dos americanos no Brasil e que muitas vezes se beneficiaram delas para a solução de crimes cometidos aqui.
José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.
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sábado, 13 de abril de 2013

O futuro da meninada do Brasil


No artigo “A formação de um povo” (Veja10/4/2013, data de capa), a escritora Lya Luft lamenta que, agora, no Brasil, (…) “a meninada só precisa se alfabetizar no fim do 3º ano.

Pergunto: o que estarão fazendo nos primeiros dois anos de escola? Brincando? Gazeteando? A escola vai fingir que está ensinando, preparando para a vida e a profissão? E os pais, que se interessam, o que podem esperar de tal ensino? Aos 8 anos, meninos e meninas já deveriam estar escrevendo e lendo bastante (…). Com que idade estarão prontos para um mercado de trabalho cada vez mais exigente?”.
Paralelamente, uma boa notícia, se for concretizada na prática. “Escola será obrigatória a partir dos 4 anos”, segundo O Globo (6/4/2013).
A mudança, sancionada pela presidente Dilma Rosseff, começa a valer a partir de 2016. “Pais não poderão mais deixar filhos fora da escola dos 4 aos 17 anos. Hoje, essa obrigatoriedade vale apenas para crianças entre 6 e 14. Sistemas terão que ofertar e garantir vagas para todos. (…) Passará a ser um dever dos pais — e não mais uma escolha — matricular seus filhos na escola”.
PETIÇÃO DE MISÉRIA
Mas, fato grave, é que “saiu mais um estudo mostrando que o ensino de matemática no Brasil anda em petição de miséria”, escreve o colunista daFolha de S. Paulo, Hélio Schwartsman (6/4/2013).
“Joyce e Mozart são ótimos, mas eles, como quase toda a cultura humanística, têm pouca relevância para nossa vida prática. Já a cultura científica, que muitos ainda tratam com uma ponta de desprezo, torna-se cada vez mais fundamental, mesmo para quem não pretende ser engenheiro ou seguir carreiras técnicas”.
“Como sobreviver à era do crédito farto sem saber calcular as armadilhas que uma taxa de juros pode esconder? Hoje, é difícil até posicionar-se de forma racional sobre políticas públicas sem assimilar toda a numeralha que idealmente as informa. Conhecimentos rudimentares de estatística são pré-requisito para compreender as novas pesquisas que trazem informações relevantes para nossa saúde e bem-estar”.
SEM DISCRIMINAÇÃO
Em “Sequestro de oportunidades”, Ronaldo de Breyne Salvagni, tratando de contas no sistema de ensino, escreve no mesmo jornal (7/4/2013) que “a grande injustiça é ver a quantidade de pessoas, especialmente os jovens inteligentes e esforçados, sendo impedidas de se desenvolver”.
“Não é dada a elas a oportunidade de aprender e crescer, por causa de uma educação pública básica e média medíocres. Esse é o problema real”.
“Além de cotas no vestibular, em breve teremos propostas de cotas de formatura, para compensar injustiças e discriminações ocorridas ao longo do curso. Em seguida, cotas para times de futebol, cotas para funcionários das empresas, cotas para sócios de clubes, cotas em academias de ginástica, cotas para fiéis de cada religião e culto e por aí vai”.
Salvagni, em outro trecho, considera que o contrário do racismo e da discriminação social não é uma “discriminação positiva”, mas sim a ausência dessas classificações. “Qualquer solução que envolva critérios de raça ou pobreza não contribui para eliminar a discriminação. Pelo contrário, reafirma, reforça e pereniza esses conceitos básicos dos mecanismos de exclusão”.
No ano passado, recorda o site www.todospelaeducação.org.br, o Brasil ganhou a chamada Lei de Cotas, que reserva 50% das vagas das universidades federais para estudantes que cursaram o Ensino Médio na rede pública.
“Metade dessas vagas considera apenas critérios raciais e a outra metade analisa ainda a renda familiar do candidato. A raça é autodeclaratória”.
Mariana Mandelli reporta (6/3/2013) que a porcentagem de alunos negros com mais de dois anos de atraso escolar chega a 14% no Brasil. Entre alunos brancos, a taxa cai pela metade: 7%. Além disso, apenas metade dos estudantes negros, ao atingir o 6º ano do Ensino Fundamental, tem a idade correta para o ano em que estuda. Os números estão na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2011.
“Dados como esses mostram que o fracasso escolar – entendido como baixo rendimento, repetência, abandono e evasão – atinge de formas diferentes estudantes que fazem parte de grupos distintos, quando observados aspectos étnico-raciais. Esse é o tema do artigo “Fracasso escolar e desigualdade no Ensino Fundamental”, da pesquisadora Paula Louzano, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP)”.
No geral, divulga o site, dados mostram que apenas 10% dos alunos que concluem a Educação Básica têm aprendizado adequado em matemática.
“Os anos finais do Ensino Fundamental e o Ensino Médio apresentam hoje os dados mais preocupantes de desempenho do País. O Brasil tem hoje, na segunda etapa do Ensino Fundamental, apenas 27% dos alunos com aprendizado adequado em língua portuguesa e 16,9% em matemática (leia abaixo o que o movimento considera como aprendizado adequado*). Apesar de terem crescido de 2009 para 2011, as duas taxas estão abaixo das metas traçadas pelo Todos Pela Educação, que eram de 32% para língua portuguesa e de 25,4% para matemática. As metas definidas pelo Todos Pela Educação são parciais e crescem ano a ano, até o patamar de 70% em 2022”.
A FORÇA DA TECNOLOGIA
Vem dos Estados Unidos a afirmação de que “é possível educar todas as crianças da escola pública em alto nível”, segundo entrevista recente de Diane Tavenner, diretora executiva e cofundadora da rede de instituições Summit. Desde 2003, quando a primeira unidade foi criada, 96% de todos os seus estudantes foram selecionados para cursar pelo menos uma graduação, reporta o portal iG.
“O mais importante é que nós preparamos todos os nossos alunos para a faculdade e carreira. Isso não é algo que todas as escolas fazem nos Estados Unidos e, possivelmente, aqui também não. Nós acreditamos nisso e levamos a sério esse objetivo. Para isso acontecer, desenvolvemos uma série de ações, mas essa é a nossa missão. E nós já provamos que é possível educar todas as crianças de escola pública em alto nível. Isso é importante, porque muitas pessoas antes pensavam que fosse impossível. E nós, junto com outros educadores nos Estados Unidos, provamos o contrário”.
“Nós começamos criando um plano de estudo personalizado para cada estudante, de modo que ele define logo que chega à escola um objetivo para sua carreira, que universidade quer fazer, que vida quer ter. A partir disso, nós desenvolvemos um plano personalizado para que ele alcance o objetivo. Depois trabalhamos para que a escola forneça todo o suporte necessário para manter o estudante nesse caminho. Esse é o ponto de partida”.
“Nós trazemos tecnologia para a escola, as crianças trabalham colaborativamente em projetos nos quais têm que resolver problemas reais, não é nada chato. Dessa forma, as crianças ficam motivadas porque se dão conta de que estão aprendendo coisas que vão ser úteis para ela. Por último, durante dois meses do ano letivo, em janeiro e junho, os estudantes ficam fora da escola e trabalham na comunidade, fazem estágios, têm experiências relacionadas a seus interesses ou paixões, que podem ser fotografia ou jornalismo, por exemplo”.
“Nós usamos muita tecnologia. Por exemplo, a tecnologia serve para saber exatamente o que cada aluno sabe e não sabe em todos os momentos. Cada estudante tem o seu mapa pessoal de conhecimento e objetivos. Em vez de promover aulas em que não importa quem sabe, mas que todos ouvem a mesma coisa e tem que participar das mesmas atividades, cada aluno vai aprender o que precisa aprender. Fazemos isso com uma ferramenta que chamamos de playlist – como a dos tocadores de música digital. Nessa lista está tudo o que o aluno precisa aprender e ele vai escolhendo como gostaria de fazer. Quando ele sente que já está pronto para seguir em frente, faz uma avaliação. Se ele realmente já aprendeu, ótimo, vai adiante”, explica Diane Tavenner, no iG.
DERAM CERTO
Neste cenário, marcado por contradições, a revista IstoÉ (10/4/2013) traz, em manchete de capa, que as cotas deram certo e revela histórias de sucesso de quem venceu o preconceito. “Uma década depois, a política de inclusão de negros nas universidades brasileiras apresenta resultados surpreendentes. Eles têm notas mais altas que a média; no vestibular, vão tão bem quanto os não cotistas; os índices de evasão são baixos; a maioria sai da faculdade empregada; eles ajudaram a melhorar a qualidade do ensino”.
O que se sabe também é sobre a vantagem de ficar mais um ano na escola, como reporta o jornal Estado de Minas (13/4/2013).
“Cerca de 300 mil estudantes que acabaram de chegar ao ensino médio são os primeiros do país que fizeram nove anos de fundamental, etapa em que entraram um ano mais cedo, aos 6. Em 2004, Minas Gerais inaugurou na educação brasileira esse sistema, que se tornou obrigatório em todo o território nacional em 2010. Os resultados já são visíveis. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de Minas saltou de 4 para 6 na última avaliação do governo federal, alçando o estado à condição de melhor do país. A evolução no aprendizado poderá ser verificada mais detalhadamente quando sair o resultado de uma prova aplicada a esses alunos pioneiros na semana passada. Mas eles mesmos são quase unânimes em dizer que se sentem mais bem preparados para a sequência dos estudos”.
O atraso da educação brasileira vai além de todas as deficiências e eventuais avanços citados. O Globo (9/4/2013), por exemplo, aponta que metade do Brasil apura fraude na merenda escolar. “Ao menos 13 estados investigam desvio do dinheiro da merenda escolar. Em Roraima, a fraude prospera onde os alunos recebem comida estragada e atrasada”.
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José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.


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