segunda-feira, 14 de maio de 2012

Sobre a notícia e a verdade


Em tempo de resistência ao trabalho da imprensa – cuja contribuição à democracia brasileira e no mundo é inestimável e incontestável – é preciso reforçar a importância da formação profissional de quem nela trabalha e entender suas posições. Apressados fazem avaliação negativa, mas é correto afirmar que um fato pode ser contado de “n”, todas no universo do que entendemos como verdade.
Exemplo: dia 13 de maio, a Folha de S. Paulo, publica em sua capa a chamada “Órgãos correm para cumprir prazo de acesso a dados públicos” – um enfoque compreensivo sobre o tema. “A três dias de entrar em vigor a lei que regula o acesso a informações públicas, sigilosas ou não, só 12 de 52 órgãos federais consultados pela Folha declararam que seus serviços de informação ao cidadão já estão em funcionamento. A partir de quarta-feira (dia 15) eles terão prazos definidos para responder aos pedidos”.
O mesmo tema mereceu a principal manchete de O Estado de S. Paulo e outro tratamento: “Lei de Acesso à Informação vai começar enfraquecida”. No texto, o jornal destaca que demora na regulamentação por parte do governo atrasa detalhamento e pode gerar confusão. “A Lei de Acesso deixou indefinidas diversas especificidades, como, por exemplo, a necessidade de identificação do requerente da informação”.
Melchiades Filho, da Folha, escreve dia 14 que não convém subestimar a Lei de Acesso à Informação. “Seu significado vai muito além do bem-vindo sinal verde para entrar nos arquivos oficiais e reconstituir episódios conturbados do país. Trata-se também de ferramenta poderosa para melhorar a gestão e desinfetar a administração pública. O brasileiro agora terá o direito de fiscalizar todo e qualquer ato dos governos. As repartições – autarquias e estatais incluídas – deverão fornecer os dados requisitados em no máximo 30 dias corridos. Compras, convênios, atas de reuniões, relatórios, folhas de pagamento: nada disso poderá ser ocultado”.
De volta ao jornalismo comparado e contra os ataques à imprensa – inteiramente desproporcionais aos seus equívocos e erros, presentes em toda atividade humana -, lembro dois tratamentos de um escândalo atual envolvendo as relações de Carlos Augusto Ramos, o empresário e contraventor de jogo de azar Carlinhos Cachoeira, com políticos, especialmente o senador, ex-DEM, Demóstenes Torres, de Goiás. Quando se usa nos textos Caso Cachoeira há, a grosso modo, uma generalização do escândalo. Já, ao usar Caso Demóstenes, também a grosso modo, o conteúdo particulariza e politiza o foco num parlamentar de oposição, que se apresentava como paladino da moralidade, enquanto, nos bastidores, protegia o contraventor (para citar o mínimo de um enorme escândalo político).
Cachoeira, na realidade, “tinha rede multipartidária em Goiás”, escreve o jornalValor Econômico, dia 14. “Filiados em Goiás de todos os grandes partidos políticos do país — PT, PMDB, PSDB e PP — mantiveram ligações, durante seus governos, com as empresas ligadas a Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira quando não diretamente com o contraventor, pivô da CPI criada pelo Congresso. Foi na gestão de Maguito Vilela, do PMDB, que uma empresa de Cachoeira venceu o processo de terceirização da loteria. Íris Rezende, também do PMDB, assinou com a Delta dez contratos para execução de obras da prefeitura. No governo do Estado, a Delta entrou via Alcides Rodrigues (PP), o vice que Marconi Perillo (PSDB) elegeu governador e que depois virou seu  desafeto. Hoje, a Delta é uma das maiores contratantes do PAC, do governo federal, e de governadores e prefeitos. O que explica a estratégia da maioria governista em atuar para evitar que as relações dos políticos goianos com Cachoeira e a Delta respinguem no Planalto”.
ALERTA
O ministro Guido Mantega mantém um discurso de serenidade diante dos esperados respingos da crise econômica mundial no desenvolvimento brasileiro. Cumpre o seu papel. Porém, há meses acompanho a deterioração gradativa da situação econômica mundial, especialmente na Europa, e suas consequências para nós. Sintoma disso é, por exemplo, a desaceleração da indústria. Queda de 3% no primeiro trimestre deste ano em relação a igual período de 2011.
Lá fora, em outro indicador, anuncia-se que o comércio exterior chinês sofre forte desaceleração. A Folha do dia 11 escreve que o comércio da China com o mundo, atingido pela estagnação europeia, teve forte desaceleração e cresceu só 2,7% em abril, abaixo dos 8,9% de março. “As importações subiram 0,3%, e as exportações, 4,9% — inferiores às previsões. O resultado preocupa o Brasil”.
Na “Entrevista de 2a.”, dia 14, o mesmo jornal afirma que Brasil não passará por crise, mas terá pouco crescimento, baseando-se em entrevista feita por Luciana Coelho com o analista financeiro indiano Ruchir Sharma, de 38 anos,que comanda o fundo para mercados emergentes do Morgan Stanley, o nono maior banco de investimento do mundo. Na opinião dele, o ritmo de expansão do país vai “decepcionar” e que é preciso mudar “a mentalidade” para avançar. “O Brasil está ficando para trás entre os emergentes, com o real supervalorizado, gargalos de infraestrutura que inibem a produção, mão de obra cara e excesso de gasto público”.
Previsão de Sharma: “Em torno de 3% de crescimento nos próximos três ou cinco anos. Mas o Brasil deveria estar crescendo ao menos 4% ou 5% ao ano. E, se o preço das commodities cair, pode ficar abaixo de 3%”.
Na mesma linha, a coluna Radar, assinada por Lauro Jardim, na Veja (dia 16, data de capa), lembra que o governo iniciou o ano ambicionando um crescimento do PIB (Produto Interno Bruto – ou a soma do que se produz no país) de 5%. “Rapidamente falava em 4%. Hoje, teme que não chegue a 3%. A propósito, as projeções do BTG Pactual estão hoje entre 2,6% e 3,4%”.
José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.
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