quinta-feira, 20 de outubro de 2011

ONGs – “Não é dinheiro de pinga”

Quando escrevo, dia 20 de outubro de 2011, 14h45m, o ministro Orlando Silva (PCdoB, Esporte) está cai, não cai. Como opina Eliane Cantanhêde na Folha de S. Paulo (dia 20), nos casos de denúncias de corrupção em seu ministério, a primeira reação da presidente Dilma Rousseff é fazer uma declaração que é lida como apoio e defesa, mas é apenas formal e em cima do muro.  “Dá assim uma resposta à opinião pública, faz uma deferência com o ministro-alvo e ganha tempo até as coisas decantarem. (…) Ela não empurra Orlando Silva para fora, mas não mexe uma palha para mantê-lo dentro, nem para o Esporte continuar aparelhado pelo démodé PC do B com a Copa e a Olimpíada bem aí”.
O que se sabe, segundo a manchete de O Globo (dia 20), é que o Palácio do Planalto já avisou dirigentes do partido que a própria imagem do governo da presidente Dilma Rousseff começa a ficar desgastada.
“O PCdoB (da base aliada governista, liderada pelo PT) comanda o ministério há quase nove anos, desde o início do governo Lula, e manteve o cargo com Dilma, mesmo diante dos desvios no programa Segundo Tempo constatados nos últimos anos pela Controladoria Geral da União, que cobra a devolução de R$ 49 milhões repassados em 67 convênios”.
TERCEIRIZAÇÃO DO GOVERNO
O caso coloca no noticiário o papel das ONGs, as chamadas organizações governamentais, e o destino de recursos públicos. É “a terceirização do governo”, escreve o colunista José Roberto de Toledo, de O Estado de S. Paulo(dia 17). “Não é estranho que cada vez mais denúncias sobre desvios de recursos que têm derrubado – ou pelo menos desequilibrado – ministros digam respeito a convênios com entidades sem fins lucrativos. Esse tipo de transferência de dinheiro público para entidades privadas tem crescido mais do que os gastos públicos diretos. Supera até o ritmo de aumento das transferências para prefeituras e governos estaduais. É uma espécie de terceirização do governo”, escreve no primeiro parágrafo de seu artigo.
Mais: “Entre 2004 e 2010, as transferências federais para Organizações Não Governamentais (ONGs) cresceram 51% a mais do que as transferências para contas administradas por prefeitos e governadores. Foram R$ 1,9 bilhão para ONGs, em 2004, contra R$ 5,4 bilhões, em 2010, um crescimento de 180%. Também nos gastos diretos do governo federal o dinheiro repassado a ONGs cresceu mais do que para outros tipos de beneficiados”.
Toledo conta que, nos últimos oito anos, entre transferências e gastos diretos, o poder federal colocou pouco mais de R$ 56 bilhões nas contas de ONGs. “Isso daria para pagar tudo o que dezenas de milhões de beneficiários do programa Bolsa Família receberam nos últimos cinco anos, e ainda teria troco. Apenas em 2010 – ano de eleição para o Congresso Nacional, para presidente e governadores -, as transferências federais para entidades sem fins lucrativos cresceram 40%, uma velocidade quase quatro vezes maior do que os repasses que Brasília fez para Estados e municípios”.
O colunista do Estadão lembra que, no balaio das ONGs, multiplicam-se organizações beneficentes com nomes que evocam causas religiosas. “Desde 2004, uma delas, chamada Fundação Bênçãos do Senhor, recebeu mais de R$ 300 milhões do governo federal para prestar todo tipo de serviços, de terceirização de mão de obra até atender população que recebe medicamento para tratamento de AIDS”.
Os números revelam descontrole de gestão. “Só em 2010, cerca de 100 mil ONGs receberam dinheiro transferido pelo governo federal. No mínimo, é uma contradição em termos de que tantas entidades ditas não governamentais vivam de recursos públicos”.
O artigo “Além da tapioca”, de Ricardo Melo, na Folha (20), refere-se à utilização de ONGs como fachada para descalabros. “O expediente, retratado à exaustão pela imprensa, serviu e serve a ministros das mais diversas origens e tintas ideológicas”.
Vale repetir: nos últimos oito anos, entre transferências e gastos diretos, o poder federal colocou pouco mais de R$ 56 bilhões nas contas de ONGs. “Não é dinheiro de pinga”, afirma Toledo.
José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.
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