quinta-feira, 15 de março de 2012

Enxada, terra e ciência


Causa e efeito, ação e reação, o homem e suas circunstâncias – assim é a realidade, na vida e na economia, mesmo relativizando os resultados de cada fato. A economia brasileira pode sofrer muitas dificuldades este ano, em consequência das crises que demoram na Europa e ainda nos Estados Unidos. Não é pouco, embora o discurso oficial seja otimista. Ser otimista é importante, mas “cantar nunca foi só de alegria/Com tempo ruim, todo mundo também dá bom dia!”, como compôs, em “Palavras”, o talentoso Gonzaguinha (Luiz Gonzaga do Nascimento Junior, 1945/1991).
O Brasil patina em sua pauta de exportações. Reportagem de Luiz Guilherme Gerbelli no jornal O Estado de S. Paulo (12 de março) mostra que somente seis produtos representam 47% do que o Brasil exporta. Minério de ferro, petróleo bruto, complexo de soja, carne, açúcar e café. Em 2006, essa participação era de 28,4%.
(Curiosidade: “O Brasil importa café processado, vejam vocês, principalmente de 3 países ricos que não produzem um só grão: Suíça, Grã-Bretanha e Itália. O pior é que esse café importado pelo país é, em boa parte, café… brasileiro”, escreveu na Veja, no ano passado, o jornalista Ricardo Setti).
O texto do Estadão alerta que esse aumento da dependência ganha contornos ainda mais preocupantes porque o maior comprador atual das matérias-primas brasileiras passa por um momento de transição. Na semana passada, a China anunciou que vai perseguir uma meta de crescimento de 7,5% ao ano. A meta anterior era de 8% ao ano. “Ao dizer que vai reduzir o ritmo de crescimento, a China diz, indiretamente, que vai comprar menos insumos”, fala o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.
Fábio Silveira, economista da RC Consultores, estima estima um recuo de 10% no preço da soja, carne, açúcar e do café este ano.
O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) definiu US$ 264 bilhões como a meta de exportação, valor 3,1% maior que o do ano passado.
Rodrigo Branco, economista da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), ressalta, porém, que o saldo comercial do País deverá ser menor, porque, além do preço mais baixo das commodities, as importações devem permanecer em um patamar elevado. “Estamos com uma demanda relativamente aquecida em relação ao resto do mundo, principalmente de bens de consumo duráveis”, explicou, em entrevista ao Estadão.
MARCHA À RÉ
Há outras preocupações significativas no emergente Brasil da chamada “nova classe média”.
Helena Nader, biomédica, é presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), membro da Academia Brasileira de Ciências e professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), escreve artigo na Folha de S. Paulo (dia 15) sobre “cortes em ciência e o país em marcha à ré”.
“Os cortes de R$ 1,48 bilhão (22%) e de R$ 1,93 bilhão (5,5%), respectivamente, nos orçamentos dos ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e da Educação (MEC), anunciados recentemente pelo governo federal, são deveras preocupantes quando se tem como compromissos o desenvolvimento sustentável, a competitividade da economia brasileira e o bem-estar de nossas gerações presentes e futuras.
Outros trechos: “Não se duvida das necessidades macroeconômicas que levaram o governo a promover uma redução de R$ 55 bilhões em seus gastos em 2012. Mas não podemos concordar que, em nome do aumento do superávit primário e da redução da dívida pública, seja comprometido o futuro do Brasil e dos brasileiros”.
“Não sabemos o quanto os cortes no MCTI e no MEC ajudarão no desempenho das contas federais, mas temos certeza sobre as suas repercussões na vida do país: prejuízos às medidas que visam reduzir o nosso inaceitável déficit educacional e à projeção no  cenário científico e tecnológico mundial, além da diminuição da já precária competitividade da indústria brasileira”.
COMPARAÇÃO
A presidente da SBPC lembra que educação de qualidade e produção de C&T (Ciência e Tecnologia) avançadas são prioridades para o desenvolvimento nacional.
“Para ficar na comparação apenas com dois emergentes, a Coreia do Sul ocupa a 15ª posição no ranking de IDH e tem renda per capita PPC (paridade de poder de compra) de US$ 31.753; a Finlândia tem a 22ª posição no IDH e renda per capita PPC de US$ 40.197. Já o Brasil ocupa a 84ª posição, com renda per capita PPC de US$ 11.767. Os investimentos públicos e privados em P&D (pesquisa e desenvolvimento) nesses países com relação ao PIB: Finlândia, 3,84%; Coreia do Sul, 3,36%; Brasil, 1,19%”.
O último parágrafo do artigo de Helena Nader: “Temos claro que os cortes no MEC e no MCTI causarão prejuízos infinitamente maiores do que o montante que se está economizando agora”.
FRASES
“Se Brasil, China e Índia decidirem copiar o estilo de vida dos desenvolvidos, serão necessários cinco planetas Terra”.
Sha Zukang, chinês, secretário-geral da Organização das Nações Unidas para a Rio+20, em entrevista ao O Globo, citado em Veja (dia 14, data de capa).
“Adriano só tem chance de jogar futebol, em bom nível, quando tratar, para valer, de seus problemas psíquicos e sociais, por quem entende muito do assunto. Não adianta apenas dar conselhos nem tapinhas nas costas”.
Tostão, cronista esportivo, um dos principais jogadores de futebol da história no Brasil, médico e psicanalista, na Folha de  S. Paulo (dia 14).
Acompanhe mais:
José Aparecido Miguel, sócio da Mais Comunicação, www.maiscom.com, é jornalista, editor e consultor em comunicação.
TEXTO PUBLICADO ORIGINALMENTE EM

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